A ideia que vem à cabeça, então, é que um segmento de reta é assim como um colar de contas, um ponto enfiado atrás do outro, enfileirados do primeiro ao último.
Era assim que pensavam, parece, os pitagóricos (membros de uma mistura entre seita, escola e comunidade, criada por volta de 530 a.C., em Crótona, no sul da Itália). E, por pensar assim, vão se meter na maior enrascada lógica!
Ora se um segmento é uma fileira de pontos, seu comprimento tem que ser proporcional ao número de pontos que contém. Isto é, se um segmento tem m pontos, seu comprimento L será m vezes o tamanho de um ponto.
Tomando dois segmentos, um de comprimento com pontos e outro de comprimento com pontos então a razão entre os comprimentos é
Veio então o grande golpe contra a Escola Pitagórica. Eles conheciam o que chamamos hoje de Teorema de Pitágoras. Este resultado já era conhecido dos egípcios, pelo menos no caso 3,4,5 e dos babilônicos, que possuíam tabelas de números que verificavam a relação dada pelo teorema. Os pitagóricos também o conheciam, mas não se sabe como o demonstraram.
Aplicando o Teorema de Pitágoras ao cálculo da diagonal do quadrado de lado com comprimento 1, temos que o comprimento da diagonal deve verificar ou seja, o comprimento da diagonal é .
Como a razão entre os comprimentos de dois segmentos é sempre uma fração então existem e números inteiros tais que
Isto não seria nada de mais se os pitagóricos não soubessem de um outro fato interessante.... Eles trabalhavam muito com números e repararam nos seguintes fatos:
- um número é par se for um múltiplo de 2, isto é, se m é par então, para algum outro número p, m = 2p ;
- seu quadrado então será , isto é, seu quadrado também é um múltiplo de 2;
Por outro lado, notaram que
- um número é ímpar se for o seguinte de um par, isto é, se n é ímpar então n = 2q + 1, para algum número q ;
- seu quadrado então será , isto é, seu quadrado é o seguinte de um par;
Dos dois fatos segue que se o quadrado de um número é par então este número tem que ser par (pois se fosse ímpar seu quadrado seria ímpar e não par).
Voltando à diagonal do quadrado de lado 1, temos que e podemos supor que e são primos entre si, pois senão dividiríamos em cima e em baixo da fração pelo fator comum. Vamos fazer então os passos seguintes:
- Elevando tudo ao quadrado temos que dando e assim é um número par. Logo, é par e .
- Como e são primos entre si e é par, o tem que ser ímpar, pois senão 2 seria um fator comum.
- Mas e , ou seja, o quadrado de é par e logo é par e não ímpar, como tinha de ser.
Os pitagóricos deram de cara então com a diagonal do quadradoum comprimento que existe, que se pode desenhar e que não se encaixava na maneira como entendiam o ponto e a reta! Descobriram que não podiam pensar num segmento de reta como um colar de contas. E isto foi uma verdadeira paulada na filosofia deles.
Mas e hoje, como entendemos um segmento de reta? É claro que a partir dos pitagóricos muita gente pensou sobre o assunto e sabemos que um segmento de reta tem que ter um número infinito de pontos (pois se tivesse só um número finito de pontos seu comprimento seria proporcional ao número de pontos e voltaríamos ao ponto de partida deste texto). Como é mesmo essa estrutura com infinitos pontos é uma longa história, cheia de ideias diferentes - algumas certas mas tão fora do comum como as do matemático russo Georg Cantor (1845-1918). Mas para contar isso tudo este post ficaria muito longo e deixarei estas ideias para uma outra vez.

