28 de novembro de 2021

A área de um círculo é mesmo a decoreba "Pi R 2"?


Michael Lynch, na conferência The Democratic Value of the Truth, disponível no Youtube, diz que hoje em dia recebemos muita informação e que, de alguma maneira, decidimos quais são verdadeiras. Em geral, consideramos verdadeiras as que vem de fontes que acreditamos serem confiáveis.

Mas quando se trata de resultados matemáticos, por exemplo que a área de um círculo é πR2, tomamos como verdades sem maiores questionamentos. Será que é porque a fonte é o/a professor/a, autoridade inquestionável? Ou será que é porque a fonte é um/a professor/a de Matemática? Fonte sempre confiável? Não sei. 

Me parece mais que a matemática é vista, e apresentada, como coisa obscura, cheia de fórmulas sem significado e que devem ser decoradas. Um A = πR2 não precisa ser verdade nem deixar de ser.  A = πR2 simplesmente é. E é isso que cai na prova.     

No entanto, se olharmos a história, veremos que a coisa nem sempre foi assim. A unidade de medida de área é um quadrado de lado 1. E qualquer outra área é definida a partir deste quadrado, observando quantos (ou quantas partes) deste quadrado unitário cabem dentro dela. Do quadrado tiramos a área do retângulo, da do retângulo a do triângulo e a partir daí de qualquer polígono. 

Mas um círculo não se compara com quadrados!! Isto não é lá bem verdade. Euclides, por volta de 300 aC, prova que dados dois círculos C1 e C2 de raios R1 e R2 então a razão entre suas áreas é a mesma que a razão entre as áreas dos quadrados de lados R1 e R2, ou seja uma área está para a outra assim como a área de um quadrado está para a outra.

Euclides não chegou a este resultado medindo vários círculos. Nenhum resultado de Euclides, na verdade, envolve medidas. 
Para provar este resultado, Euclides primeiro usa uma observação de Antifonte (480–411 aC) de que podemos inscrever polígonos regulares em um círculo com o número de lados que quisermos.
Euclides prova então que quanto maior o número de lados, mais a área do polígono se aproxima da área do círculo. Mas um círculo não é um polígono e por mais parecida que a área seja, nunca terá o valor da área do círculo.
 
O próximo passo de Euclides foi mostrar que se temos dois círculos C1 e C2 de raios R1 e R2 e se P1 e P2 são dois polígonos com o mesmo número de lados, inscritos cada um em um dos círculos, então a razão entre suas áreas é a mesma que a razão entre as áreas dos quadrados de lados R1 e R2 ou seja 
 
Usando estas ideias Euclides prova que a razão entre as áreas dos dois círculos não pode ser nem maior e nem menor do que a razão entre as áreas dos quadrados. Logo terá que ser igual. E Euclides para por aí. 
 
Arquimedes, mais de 50 anos depois, é que vê que podemos comparar diferente
e este resultado quer dizer que existe um número que vale para qualquer círculo, isto é a área(C)/Rdá sempre o mesmo número, independentemente de quem é o círculo C, ou seja área(C) = número × R2
E este número só foi se chamar π no século XVII.


A conferência de Michael Lynch pode ser vista em link

A prova de Euclides pode ser vista no livrinho A área e o perímetro de um círculo, escrito por mim para o I Colóquio Regional de Matemática da região sudeste.

As imagens dos polígonos foram tiradas do texto Fórmulas de áreas através de recortes de Daniela S. Hoffmann e Maria Alice Gravina.

 



 

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